Giro do Vale

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terça-feira, 30 de abril de 2024

Índios de outra região ameaçam invadir aldeia às margens da BR-386 em Estrela

Aldeia

Juíza determina a entrega da posse das moradias aos indígenas da comunidade de Estrela tão logo a Funai conclua vistoria. (Foto:Divulgação)

A polêmica em torno da duplicação de 33,4 quilômetros da BR-386 ganha mais uma etapa. Após despacho da 1ª Vara Federal de Lajeado, órgãos de segurança da região se mobilizam para evitar iminente invasão de índios caingangues da tribo Votouro à nova aldeia localizada às margens da rodovia, em Estrela. Eles questionam a origem dos indígenas da região e querem ocupar as casas recém-construídas.

Dnit, Funai, Consórcio Iccila-Planus e governos do Estado e da União são réus na ação civil pública do Ministério Público Federal (MPF). A Justiça ordena vistoria imediata das 29 moradias construídas e posterior remoção dos índios caingangues de Estrela para a nova aldeia.
Conforme o documento, a Funai precisa finalizar a vistoria até este sábado. Já a entrega do relatório técnico com o resultado da visita deve ocorrer em, no máximo, 15 dias, sob pena de multa diária a ser fixada pela juíza federal substituta, Aline Lazzaron Tedesco.

A juíza determina ao Dnit e Consórcio Iccila/Planus entrega da posse das moradias aos indígenas da comunidade de Estrela tão logo a Funai conclua a vistoria. O departamento também deverá providenciar o desmanche das casas antigas logo após a mudança, permitindo a continuidade das obras de duplicação da rodovia. Haverá multa para quem descumprir as imposições.

O despacho da Justiça exige ainda que os serviços de inteligência da Polícia Rodoviária Federal (PRF), Polícia Federal (PF) e Brigada Militar (BM) atuem em conjunto para evitar um conflito entre indígenas na região de Estrela, até que toda a remoção da tribo esteja finalizada.

Os órgãos de segurança também foram intimados para monitorar qualquer deslocamento de indígenas na região de Benjamin Constant do Sul, no norte do estado, onde vive a comunidade Votouro.

Conforme o despacho da juíza federal, mesmo que se trate de medida que interfira na liberdade de ir e vir, “esta se justifica na necessidade de manutenção da ordem social e da salvaguarda integridade física e da vida dos indígenas e agentes policiais envolvidos.”

À PRF, caberá a interceptação de qualquer veículo usado no transporte dos potenciais invasores, enquanto a BM deverá se manter em estado de prontidão para prestar apoio, caso solicitado.

Para a juíza, a medida mais correta de garantir segurança para as comunidades indígenas envolvidas e ao patrimônio público é interceptação dos índios da aldeia Votouro que “eventualmente estejam ou venham a se deslocar para esta região, ainda durante o percurso, evitando-se qualquer aproximação da aldeia localizada às margens da BR-386 em Estrela.”

Mesmo assim, ela alerta para as dificuldades de efetivo enfrentadas pelos principais órgãos de segurança do RS. Aline pondera que, embora necessária, “a alocação de efetivo considerável da polícia militar na solução do possível conflito poderia comprometer seriamente a segurança pública em seus serviços ordinários em toda a região.”

Funai atesta origem indígena
De acordo com o autor da ação, um grupo de 150 índios – entre eles 53 crianças – estaria se preparando para ocupar as moradias construídas nas margens da BR-386. Segundo o MPF, integrantes da tribo situada no norte do estado ameaçam invadir o local por não reconhecerem os cainguangues como indígenas.

Na decisão judicial, a magistrada atesta a origem indígena da tribo de Estrela. Ela se baseia em laudo antropológico de Miriam Chagas, analista do MPF. Documentos encaminhados pela Funai também confirmariam a tese. “Trata-se de comunidade indígena.”

A juíza observa ainda para os riscos causados pela demora na mudança de local da aldeia. “A cultura indígena, mesmo pacífica, tem em suas tradições e em seu histórico a apologia à bravura e a disposição à luta pela defesa ou conquista de seu território.” Para ela, existe “real risco de confronto” no local.

De acordo com a antropóloga e chefe da equipe de licenciamento ambiental da Funai em Brasília, Julia Paiva, o conflito entre os caingangues de Estrela e da tribo Votouro é antigo. Mesmo assim, ela considera “remota” a chance de uma briga ou invasão às margens da BR-386.

Histórico de violência
A existência dos índios caingangues da aldeia Votouro, em Faxinalzinho, no norte do estado é cercada de polêmicas e violência. Estima-se que mais de mil moram em aldeias daquela região. Em maio do ano passado, cinco deles – incluindo dois caciques – foram presos acusados de participação na morte de dois irmãos agricultores em abril de 2014.

Os agricultores Anderson de Souza, 27, e Alcemar Batista de Souza, 41, foram linchados. Depois da prisão dos índios, o prefeito da cidade, Selso Pelin, chegou a abandonar a cidade com medo. Ele disse ter saído do município para “não ser morto, pois os índios estavam revoltados e havia boatos de que mais estariam vindo de outros lugares, armados, para destruir a cidade.”

Pelo menos 170 famílias de produtores rurais estão envolvidas em uma disputa agrária antiga em Faxinalzinho. Conforme a Funai, a demarcação original das terras ocorreu entre 1918 e 1919.

No período, eram mencionados 31 mil hectares aos indígenas. Na década de 1940, os índios foram retirados da aldeia Votouro Velho – onde residiu o lendário cacique Votouro. Em 1962, o governo estadual tomou 1.515 hectares, destinando 883 a agricultores e 632 hectares a uma reserva florestal.

Empecilho na duplicação
A construção da nova aldeia caingangue às margens da BR-386 é empecilho para a liberação das obras de duplicação da rodovia naquele trecho de 1,8 quilômetro. O Dnit investe cerca de R$ 8,5 milhões nesse empreendimento, iniciado em 2014. As 29 moradias estão prontas faz meses, e a inspeção da Funai iniciou nesta semana. A previsão é respeitar os 15 dias exigidos pela justiça.

Faltará ainda concluir a escola, a casa de artesanato e a de reunião. O contrato entre Dnit e consórcio previa o fim das obras até dezembro de 2014. Em nota, o departamento informa que só aguarda o parecer da Funai para realocar a comunidade indígena e dar continuidade ao processo de remoção.

A expectativa do Dnit é iniciar as obras de duplicação no trecho tão logo a área esteja liberada pela Funai e pelo Ibama. Hoje, a duplicação da BR-386 está 91% concluída. O novo prazo estabelecido para encerrar a obra é fim deste ano e início de 2016. O ritmo no trecho restante é lento e o governo federal está dificultando a liberação de dinheiro para a construtora.

O que exige a Justiça

Estado:
Obrigação de garantir a segurança na área que será entregue para a comunidade indígena de Estrela, localizada entre o Km 359 e 360 da BR, em Linha Glória. Contingente deve ser definido pela Brigada Militar, desde o presente momento até que a comunidade indígena caingangue conclua a mudança para as novas moradias, sob pena de multa diária a ser fixada pela Justiça em caso de descumprimento.

Funai:
A obrigação de realizar a vistoria das construções no período de 8 a 11 de julho de 2015, abstendo-se de cancelar ou modificar a data, com entrega do relatório de vistoria em 15 dias, sob pena de multa diária a ser fixada pela Justiça em caso de descumprimento.

Iccila
A obrigação de fazer a entrega da posse das moradias aos indígenas da comunidade indígena de Estrela tão logo a Funai conclua a vistoria, sob pena de multa diária a ser fixada pela Justiça em caso de descumprimento.

Dnit:
A obrigação de fazer, imediatamente após a vistoria realizada pela Funai e o término da mudança das famílias da comunidade para as novas moradias, o desmanche das casas antigas. Após, liberar a continuidade das obras de duplicação da rodovia, sob pena de multa diária a ser fixada pela Justiça em caso de descumprimento.

PRF, PF e BM:
Intimados a identificar eventual deslocamento de indígenas de aldeias do norte do estado, em especial os líderes Abílio Pendere Casemiro, Darci Forte e demais integrantes da tribo Votouro, em direção à aldeia caingangue de Estrela.
Em caso tal tal movimentação, acionar todas as forças policiais da região para montar barreiras e evitar o deslocamento até Estrela e o consequente confronto entre as duas tribos.

 

Jornal A Hora

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